edição 35 | abril 2022
Texto: Rosiney Bigattão
Os números são bastante conhecidos – apesar de serem a maioria, os negros têm pouca participação no mercado de trabalho formal, principalmente aquele que exige formação mais especializada. Por isso chama a atenção o fato de 100% das vagas do Jovem Aprendiz na Águas do Rio (RJ) terem sido preenchidas por quem se autodeclara preto ou pardo. Outro bom exemplo entre tantos desafios para a população negra vem da Águas Guariroba (MS), unidade da Aegea na qual, após quatro anos da implantação do Programa Respeito Dá o Tom, 56% dos colaboradores são pessoas negras.
Pesquisa feita pela área de Recursos Humanos da Aegea em 2021 constatou que 54% dos supervisores da empresa se autodeclaram negros. Entre os trainees, são 43% dos colaboradores. Ao todo, 61,9% dos funcionários da Aegea são autodeclarados como pretos ou pardos. Para ampliar ainda mais esses números e fomentar a discussão em torno da empregabilidade e da igualdade nas oportunidades, foi feito em parceria com o ID_BR, o Instituto Identidades do Brasil, um treinamento com foco em Recursos Humanos para todos os profissionais da área.
O debate sobre os conceitos da pauta racial, as práticas antirracistas e meios para ampliar a diversidade dentro da empresa, que fizeram parte do treinamento, continuam em outras ações. Trabalhando por mais inclusão, o Respeito Dá o Tom (RDT) acredita na conscientização e no poder da informação como aliados contra o preconceito, pois a discriminação continua mesmo depois que se consquista uma vaga. Uma pesquisa do Instituto Locomotiva aponta que 52% dos negros que estão no mercado de trabalho formal sofreram algum tipo de discriminação. Contra isso e a favor da conscientização, o trabalho do RDT é rotineiro.
Para conscientizar, são duas linhas de atuação, uma voltada para a pessoa negra – preta ou parda –, questionando se ela está conectada com sua história e cultura. Na segunda, direcionada para os brancos, se têm percebido a posição deles na sociedade se responsabilizando por não reproduzirem comportamentos que reforcem desigualdades. Em recursos como lives, rodas de conversa, palestras e campanhas, o programa mostra que pequenas atitudes fazem grande diferença.
Uma das lives trouxe a pergunta: o que é ser negro? “Apesar de parecer óbvio, o questionamento é importante para situar as pessoas na história, pois a partir do melhor entendimento do passado, de como se deu a escravidão e todo o contexto do racismo estrutural, fica mais fácil conquistar as mudanças que precisam ser feitas para maior diversidade não só na Aegea, mas no meio à nossa volta”, afirma Keilla Martins, coordenadora do Programa Respeito Dá o Tom.
Conduzidos por ela e Vinicius Archanjo, especialista em relações étnico-raciais e consultor do ID_BR, os participantes apontaram pessoas negras que os inspiram. Alguns nomes: Maria Luiza, da Aegea SC, inspira Keilla Martins pela sua força e alegria. Vanessa Andrade, da Aegea RO, pela sua determinação. Noah Vaz da Costa, pelo coração e pela generosidade. A coordenadora do RDT também se inspira em Reginalva Mureb, diretora-presidente das unidades da Aegea em Santa Catarina.
A executiva da Aegea, que recebeu o Troféu Responsabilidade Social – Destaque SC como empresa de Médio Porte, da Assembleia Legislativa, pelo trabalho desenvolvido na Águas de São Francisco do Sul, acompanha de perto o trabalho do Respeito Dá o Tom. Ao comentário de Keilla, respondeu que o movimento do RDT tem sido uma constante inspiração para todos. “A Aegea já atende 10% da população brasileira e é forte instrumento para mudança de mentalidade quanto a preconceito, racismo e discriminação”, diz Reginalva.
Marcos Valério Araújo, da área Comercial de Grandes Clientes da Águas do Rio e um dos responsáveis pelo Respeito Dá o Tom, comemora os comentários durante a live. “Estou imensamente feliz por todas as manifestações que o RDT proporciona para a conscientização da equidade racial tão desejada por todos da Aegea do norte ao sul do Brasil. No fim, o que queremos é um país livre de racismo”, afirma o executivo.
Outra vertente são as Pílulas do Conhecimento. Semanais, trazem pequenos vídeos que ajudam a entender os temas que podem ampliar a igualdade racial. Na campanha Janeiro Branco, por exemplo, feita para chamar a atenção para as necessidades relacionadas à saúde mental, o Respeito Dá o Tom trouxe o tema para a questão da população negra. Mostrou como as mais diversas injustiças sociais, a falta de acessos e direitos não garantidos afetam os negros.
As Pílulas trazem à tona expressões que parecem inofensivas, mas são carregadas de conteúdo negativo por conta do racismo estrutural, como amanhã é dia de branco. Juliane Ferraz, da equipe Comercial da Regional 1 da Aegea, explica a origem da expressão, que vem da época da escravidão, quando as atividades desenvolvidas pelos escravos não eram consideradas trabalho. Outros colaboradores já falaram sobre trabalho nas coxas, a coisa tá preta e assim por diante.
Uma outra linha das Pílulas reconhece e valoriza o trabalho de pessoas negras, como os inventores. A colaboradora Giselma Fernandes gravou um vídeo para contar a história de Benjamin Montgomery, inventor da hélice de barco movida a vapor. Ianca Raynara fala da trajetória de Otis Boykin, engenheiro negro que inventou o resistor eletrônico. Maria Vitória Ribeiro fala sobre a inventora Marie Van Brittan Brown, mulher negra que criou o sistema doméstico de segurança utilizando câmera.
Os comitês do RDT da Águas de Timon (MA) e da Águas de Teresina (PI) também trabalham neste sentido, apresentando personalidades negras que valem a pena conhecer. Entre elas Esperança Garcia, inspiração para o movimento negro na luta contra o racismo e sexismo. Escravizada, foi reconhecida como a primeira advogada piauiense, em 2017, pela OAB do Piauí.