edição 30 | janeiro 2021

EFICIÊNCIA OPERACIONAL E ENERGÉTICA Caminhos para a universalização

Moisés Menezes Salvino, gerente de Engenharia da Operação da Aegea.

Entrevista a Rosiney Bigattão

O conhecimento teórico contribui para a conquista da eficiência operacional?

Contribui muito e, por isso, estudei bastante, pois acredito que com a formação técnica é possível ter o olhar diferenciado que o mercado exige agora. Antes não se tinha tanta preocupação com a eficiência, principalmente a energética, as questões ambientais, os cálculos com os gastos energéticos passaram a ser incluídos nos cursos e isso tem refletido tecnicamente nos projetos para abastecimento, no dimensionamento de bombas, adutoras… A eficiência energética e a redução do desperdício de água, por exemplo, são questões fundamentais no saneamento e a Aegea trabalha muito nisso, a cada dia a busca é a de melhorar as operações e entregar mais água com menor custo.

Como foi a sua formação técnica?

Fiz graduação em Engenharia Civil e Ciência da Computação, com mestrado e doutorado em Engenharia Mecânica, em um dos cinco laboratórios de eficiência energética e hidráulica em saneamento no Brasil, na Universidade Federal da Paraíba (PB). O mestrado foi voltado para o dimensionamento de sistemas de abastecimento de água. E o doutorado foi calibração de redes para identificação de perdas, tanto de água quanto de energia, eficiência, no caso. O título era Reabilitação de Redes de Abastecimento de Água. Foi uma tese que envolveu vários assuntos dentro da eficiência operacional e está bem alinhada com a minha atuação hoje. Depois, fui para Espanha, Portugal, Argentina, tive contato com profissionais de outros países e o que vi lá fora eu queria trazer para o Brasil, colocar em prática tudo o que eu estudei nesses 16 anos, e a Aegea está me dando esta oportunidade. Temos equipe exemplar, tecnologia e uma oportunidade de fazer acontecer. A ideia é criar um grupo de excelência, replicar esse conhecimento e aplicar da melhor forma possível.

Como é para colocar em prática esse conhecimento e conseguir o engajamento das equipes nessas questões?

É um desafio, até porque na Aegea tem várias unidades, cada uma com suas culturas próprias. A saída é o diálogo diário, constante. Conversar sobre tudo, fazer com que as equipes se sintam à vontade para falar quando precisam. Tem dois caminhos. Um quando somos procurados para resolver os problemas, do tipo: tem uma determinada bomba, qual a melhor forma de operá-la? Então, eles entram em contato, nós orientamos sobre as várias tecnologias disponíveis, falamos sobre a modelagem hidráulica, capaz de dar um retorno sobre o funcionamento o mais breve possível – isso é bem importante, pois a operação exige respostas rápidas. O outro é quando percebemos, ao analisar os sistemas, que podem ser feitas melhorias. Daí, proativamente, procuramos o pessoal da unidade, explicamos tecnicamente o que pode ser feito. Temos colhido bons frutos dessa abordagem e o retorno positivo dos projetos implantados traz um reforço do que essas ferramentas novas têm a agregar.

Quais vão ser as principais linhas de atuação neste ano?

A Aegea está investindo bastante no sensoriamento e, assim, vamos conseguir medir melhor se há perdas de energia, caso contrário não se tem percepção do que está sendo gasto na produção e no transporte da água. Tem um projeto neste sentido na Prolagos, é uma das primeiras a implantar isso e a concessionária está fazendo uma medição praticamente em tempo real dos principais conjuntos de bombeamento. O acompanhamento deles, a tecnologia envolvida, as análises, é uma soma de fatores que resulta na aproximação com as unidades e melhora os indicadores de energia. Quando uma concessionária conquista um resultado positivo, surge um efeito dominó, dá certo em uma, outra implanta e assim vai ampliando para as outras.

Quais outros projetos estão em desenvolvimento?

Temos alguns projetos em curso em busca de mais eficiência energética. Um deles é o Diagnóstico Hidroenergético. Está sendo feito a quatro mãos, a engenharia da Aegea e as concessionárias, é uma revisão técnica das maiores unidades consumidoras. Um outro é o chamado Auditorias Energéticas: é feita uma análise para estudar melhorias possíveis, que envolvem tanto a redução do consumo de energia quanto a qualidade do serviço prestado. Em alguns casos, era a água que não estava chegando a certos pontos da cidade e, com o uso de tecnologia, conseguimos entregar.

Onde está sendo realizado o Diagnóstico Hidroenergético?

Na Águas Guariroba (MS), Prolagos (RJ), Águas de Teresina (PI) e Águas de Manaus (AM). São as maiores unidades e, consequentemente, as que consomem maior parcela de energia – 51% do total que é despendido nos bombeamentos, nas estações elevatórias, na empresa toda. É feita uma avaliação do equipamento, se ele está operando em suas condições ótimas. O sistema é analisado como um todo, o trajeto daquela água da origem até seu destino, a fim de ver qual a melhor logística para isso. Inclusive, se necessário, a gente redesenha o sistema. As principais ações são: melhorias dos bombeamentos, nos barriletes de sucção e recalque com redução das perdas de carga, duplicação de linhas de adução e elevatórias intermediárias. Todos os temas abordados têm seu estudo de viabilidade econômica para implantação.

Como será assumir todas as empresas dos últimos leilões?

Um dos diferenciais da Aegea nos leilões foi a eficiência operacional, ela torna a empresa muito competitiva. E este é o desafio, melhorar ainda mais a infraestrutura da operação, implantar as novas ferramentas, o acompanhamento de indicadores, os projetos com maior índice de eficiência energética. Vamos levar para essas novas empresas uma série de fatores que a Aegea vem melhorando ao longo dos anos, ela chegou a um patamar para poder se tornar ainda mais competitiva e aproveitar as oportunidades que vão surgir com o Novo Marco Legal do Saneamento. E ser ainda mais eficiente.

Para 2021, a ideia é aumentar ainda mais a capacidade técnica?

Já temos um corpo técnico avançado, multidisciplinar, nas áreas de mecânica, hidráulica, civil, ambiental, elétrica e computação, e continuamos estudando. Tem a Academia Aegea, todo mundo conversa, um vai aprimorando o conhecimento com o outro, este é um diferencial das equipes da Aegea. Além das ferramentas que estão sendo desenvolvidas internamente para que possamos ter respostas cada vez mais rápidas, pois a velocidade também importa no nosso setor e, principalmente, nos leilões. Recentemente tivemos uma reestruturação da área da engenharia. A Eficiência e Tecnologia (E&T) foi dividida em duas, a parte de Engenharia da Operação, que inclui perdas, energia e concepção de sistemas, sob minha responsabilidade, e outra de Infraestrutura Digital, em que entra inovação, processos e novas tecnologias, na gerência do Marco Aurélio Pereira. Como a empresa cresceu muito, esta nova estrutura consegue atender melhor todas as áreas e unidades.

A Aegea está preparada para mais crescimento?

A reestruturação já adequa para o crescimento e a empresa está investindo continuamente em capacitação e tecnologia para crescer ainda mais. O grupo vem se aprimorando, criando novas ferramentas para conseguir abraçar esse novo patamar. Passamos por vários desafios, ainda estamos enfrentando uma pandemia, tem a necessidade de integrar equipes mesmo estando distantes, e ainda assim conseguimos desenvolver vários projetos inovadores ao longo de 2020, e, apesar de tudo, mantivemos a operação, a qualidade dos serviços e fomos inovadores, garantindo a segurança dos nossos colaboradores e de nossos clientes, dentro dos padrões exigidos.

Como a pandemia impactou a área de eficiência energética?

A COVID-19 exigiu uma nova postura, teve um impacto em várias áreas, inclusive um incremento do uso de água por causa da questão da higienização e mudança de comportamento dos nossos clientes, e conseguimos atender. Tivemos de nos superar e, dentro da logística operacional, tanto da parte de projetos como da eficientização, teve um impacto até, podemos dizer assim, positivo, se é que houve algo positivo em um momento tão crítico para a humanidade, mas nós conseguimos entregar água com qualidade e quantidade. Temos ferramentas de comunicação muito rápidas que conseguem reunir pessoas de várias localidades em tempo recorde. É um diferencial que veio para ficar, um “novo normal” que faz da Aegea ainda mais preparada, pois a empresa tem equipe técnica especializada para abraçar os novos desafios, as novas tecnologias e a gente está cada vez buscando mais eficiência para poder, nos anos que estão por vir, levar mais saúde e qualidade de vida para as pessoas que atendemos.

Qual o legado que 2020 deixa?

O que ficou perceptível é a questão da nossa adaptação, nós somos mestres em brasicidades, como a Aegea está distribuída em praticamente todo o Brasil, já temos essa facilidade de adaptação, que nos ajudou muito a superar as dificuldades com a pandemia, tanto por parte da prestação dos serviços quanto dos colaboradores, trabalhando com segurança e conseguindo ultrapassar expectativas; este foi o legado de 2020. Outro desafio foi a questão da estiagem, municípios de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul sofreram um impacto muito grande com a seca, foi desafiador, dia a dia lutando para entregar água a esses usuários para que o sistema não ficasse comprometido, sem abastecimento. Continuaremos buscando soluções para conseguir atender sempre da melhor forma possível.

Qual o objetivo, as metas para a década que começa?

Temos muitos desafios, como as novas concessões, aproveitar as oportunidades que virão, além de melhorar o que estamos operando. São muitas as realizações a serem feitas: conquistar maior eficiência energética, temos vários projetos de migração para o mercado livre de energia, frentes também para diminuir perdas de água e enfrentar os desafios com as questões climáticas, que devem ser a grande preocupação das empresas e de todo o planeta nos próximos anos. Queremos conhecer mais, termos um domínio total do tema de mensurar a produção de água, saber o que estamos ganhando, o que estamos perdendo e, segundo, ter o acompanhamento desses projetos para trazer um retorno de eficiência energética, por exemplo, o projeto de Diagnóstico Bioenergético, que vai impactar bastante em 2021. De uma forma geral, queremos aliar planejamento e técnica. Os dois, de mãos dadas, com tecnologia de ponta, vão ajudar a Aegea a alcançar o estado da arte dentro da eficientização dos sistemas de água e esgoto.

É o momento do saneamento?

Sem dúvida, se eu encontrasse um estudante de Engenharia, que está começando agora, eu diria para ele: pode investir nas disciplinas de água e esgoto que é a bola da vez. Muita coisa já foi desenvolvida para estradas, a parte estrutural tem evoluído, mas agora é o saneamento que está atraindo todos os olhares, tendo em vista este mercado que está aquecido em função da universalização. Para fazer a implantação de uma rede, tem de fazer uma vala, estruturar e já existe um equipamento que corta só o necessário, a minivaletadeira, o operador nem entra dentro da vala, assenta mais rápido, então é preciso buscar tecnologias, desde as mais simples até as mais elaboradas que, associadas aos investimentos, vão ampliar o acesso ao saneamento mais rapidamente. O Novo Marco Legal veio para mudar a realidade que está aí e acredito que só com essa parceria entre o público e o privado que vamos conseguir essa universalização.

Por que a escolha pelo saneamento?

Eu investi na parte de estrutura, pois gosto muito de cálculo, mas vi que saneamento era um setor mais promissor e completo, em que haveria mais campo de trabalho, pois envolve muitas variáveis e essa multidisciplinaridade me atraiu. Quando eu saí do laboratório, do doutorado, montei uma empresa de tecnologia e projetos para atuar no Nordeste; não tinha nada parecido, fiz projetos interessantes, de modelagem hidráulica – inclusive fiz a tradução do software Epanet, programa para simulação de sistemas de distribuição de água, que é usado no país todo. Em contrapartida, consegui ter uma visão sobre como existem sistemas precários, da falta de investimentos e mão de obra qualificada. Há três anos estou na Aegea, uma empresa que está saindo na frente com toda esta questão de tecnologia. O primeiro projeto na empresa foi em Manaus (AM) e ali eu senti na prática a importância do saneamento, ver o pessoal na palafita, sem água regularizada, tratada e, depois, a água chegando, de qualidade, em quantidade suficiente, isso é gratificante e acredito que o papel da Aegea é justamente estar alavancando a universalização. Enquanto for possível, vamos trabalhar para que isso ocorra da melhor forma.